Postado por: Mundo Raimundo quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Helena escreve para a coluna From Hell  



Brian morava numa bolha de plástico e criava porcos. Tia Iara já se convencera de que nada mudaria a vida daquele rapaz. Era aquele eterno acorda-levanta-dá comida aos porcos-sai da bolha-lava a cara-volta pra bolha-dá atenção aos porcos-conversa com os porcos-sai da bolha- entra na bolha (pausa pro narrador esquizofrênico respirar)- limpa as fezes dos porcos-come-conversa com os porcos-dorme. Tia Iara lamentava tamanha devoção aos bichos. Aos porcos, as batatas, digo, os louros. Brian vivia pros porcos, ainda que os porcos vivessem em prol próprio. Brian era ingênuo, coitado.
- Vai pra rua tomar um ar, rapazote!
Brian não queria e não podia. Rua pra quê, se não podia sair da bolha? Tomar um ar? Só podia ser piada. Até que a bolha era legal. E os porcos, bem, eles não eram os porcos de Orwell: eram educados e obedientes. Jamais defecavam fora do curral. Não matavam as amigas e vizinhas galinhas. Nem latiam.
Um dia o porco Cipreste, o mais velho do bando, acordou injuriado, ainda que não fosse imprudente francamente. Resolveu ler o horóscopo para tentar controlar a angústia. Afinal, não seria de bom tom preocupar Brian, visto que era um grande e, ao mesmo tempo, frágil companheiro.
 Gêmeos, 29 de agosto de 2005:
Everywhere there's lots of piggies
Living piggy lives
You can see them out for dinner 
With their piggy wives
Clutching forks and knives to eat their bacon.

Do outro lado do mundo, as coisas obedeciam a ordem natural do agridoce cotidiano. Eric aparava a barba. Julia coava o café. Roland se preparava para pegar o ônibus. Caetano voltava pra casa. Jordana esqueceu de desligar o forno e explodiu o quarteirão inteiro. Stanley redigia o discurso de formatura da turma de doutorandos em reprodução assistida das abelhas.
Foi nesse mesmo dia em que Brian descobriu o amor. O fatídico 29 de agosto de 2005. O Velho Major e o porco Cipreste nunca mais receberam milho na boca. Tiveram que entoar um canto de rebelião e de revolta e, sem obter sucesso, pularam a cerca. A bolha estourou, Brian morreu por falta de ar: não se sabe se por emoção ou por puro descontrole. Estupefato. Não morreu de amor, só as prostitutas de José Alencar conseguiriam tal feito. Pelo menos é o que constava no atestado de óbito: “falência múltipla dos pulmões”. O coração estava intacto.
A impostora era uma porca disfarçada de gente. Queria o curral só pra si. Espantou os outros porcos, matou o pobre Brian tirando-lhe todo ar. Não apelou pro coração, seria golpe baixo. Até os porcos sabem ser éticos, ela alegaria tardiamente. Tirou o ar dos pulmões, roubou-lhe o que mais lhe faltava. Tia Iara fez as malas e foi morar em Yukon.
Jasmine, a porquinha astuta, agora reina em paz e soberana na fazenda de Brian. Não tem milho, não tem amigos, só tem terras e sujeira. E bacon em abundância.
- Será que ainda tem cerveja na geladeira?
...
Do outro lado do mundo, eu ganhava na loteria.

The end
Nota do autor: nenhum animal foi prejudicado durante a produção desta história.


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